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Notícias

POR ARMANDO SILVA AFONSO

Os dias da água

Foi no dia 22 de março de 1992 que a ONU decidiu publicar a «Declaração Universal dos Direitos da Água», instituindo o Dia Mundial da Água.


Em Portugal existe e comemora-se também um outro dia da água: o Dia Nacional da Água. É o dia 1 de outubro, que assinala o início do ano hidrológico, que decorre de 1 de outubro a 30 de setembro.

Esta proximidade entre o ano hidrológico e o ano académico não é coincidência. Afinal, ambos seguem o ritmo da natureza, que se inicia e renova com a fonte de vida que é a água e descansa na estiagem de verão. …
A água doce, contudo, está a tornar-se um bem escasso. Fruto não só do crescimento exponencial da população no planeta mas, principalmente, do nosso modelo de crescimento económico, um verdadeiro devorador de recursos, que os assume como inesgotáveis. Uma T-shirt precisa de 2,7 m3 de água para ser fabricada; um simples circuito impresso, 13 m3; um automóvel, 400 m3; uma bica, 140 litros! Em Portugal, a pegada hídrica por habitante (volume total de água usado globalmente para produzir os bens e serviços que consumimos) é a 6ª maior do mundo!

Como refere a WWF, no seu Relatório Planeta Vivo 2008, «o uso insustentável da água é um problema crescente no mundo e o declínio dos ecossistemas hídricos é mais acentuado que o declínio da biodiversidade marítima e terrestre». Atualmente 884 milhões de pessoas no mundo não têm acesso a uma água potável de qualidade. Uma criança morre a cada 15 segundos por falta de água potável (quanto tempo demorou a ler este artigo?) … Por isso, em 29 de julho de 2010, a Assembleia geral da ONU entendeu reconhecer que o acesso a uma água de qualidade é também um Direito do Homem! Mas só depois de 15 anos de debates e com 41 abstenções…


De facto, rodeados de água, parece-nos que a água doce nunca nos faltará. Mas recordemos o sábio aviso de Meadows et.al («Além dos Limites», 1993): Em termos globais, há um grande excesso de água mas, devido aos limites operacionais e à poluição, só será suportável na realidade uma duplicação da procura, coisa que ocorrerá entre vinte e trinta anos.


Portugal já foi alertado por várias entidades internacionais dos riscos de escassez e de stress hídrico que são previsíveis num futuro relativamente próximo no nosso território. Não podemos esperar mais…


Que fazer? O primeiro passo para a sustentabilidade é a eficiência! Precisamos de aumentar a eficiência no uso da água em Portugal. A todos os níveis: agricultura, industria, setor urbano… A ineficiência global no uso da água em Portugal está atualmente estimada em mais de 3 x 109 m3/ano, correspondendo a cerca de 39% do valor global da procura de água no país. O seu valor económico é de 750 x 106 €/ano, representando aproximadamente 0.65% do Produto Interno Bruto português.


O maior consumidor é a agricultura. Mas o maior valor do desperdiço está no setor urbano, pois a água que distribui não é apenas água doce: é água de qualidade alimentar. A eficiência nas redes públicas (redução de fugas, etc.) e a eficiência hídrica nos edifícios têm uma importância crescente, que, infelizmente, escapa à maioria dos cidadãos. Vivemos a época da «eficiência energética nos edifícios», mas temos rapidamente de passar para a «eficiência hídrica nos edifícios», como aliás salientou recentemente Johannes Hahn, o Comissário Europeu da Política Regional.


No Campus Sustentável da Universidade de Aveiro começam a dar-se os primeiros passos neste sentido. Para os novos edifícios do CICFANO e da TELEMÁTICA, já em construção, estão a ser estudados sistemas de aproveitamento de água da chuva, seguindo o exemplo da Engenharia Civil, onde já está instalado um pequeno aproveitamento de águas pluviais para o Laboratório de Hidráulica. Em edifícios futuros, haverá que interiorizar nos projetistas a necessidade de considerarem, logo no projeto, a aplicação de produtos eficientes, rotulados, pelo menos, com a letra A de eficiência hídrica.

Após a recente auditoria de eficiência hídrica efetuada ao edifício da Reitoria, no âmbito de um projeto da CIRA [Comunidade Intermunicipal da Região de Aveiro], onde se obteve uma economia potencial de 23,7 % no consumo de água, mais seis edifícios do Campus serão objeto de uma intervenção análoga, ainda durante o ano de 2012. Em 2013 continuar-se-á a intervenção.

São os dias da eficiência hídrica que se aproximam. E a Universidade de Aveiro, como é sua tradição, liderando esses tempos…

Armando Silva Afonso
Professor no Departamento de Engenharia Civil da Universidade de Aveiro

FONTE